110 anos do clube que fortalece a identidade e a autoestima da minha quebrada

Gabriel Lopes de Paula
4 min readSep 9, 2020

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Semana passada o Sport Club Corinthians Paulista fez 110 anos. Apesar de ter nascido no Bom Retiro, bairro da região central de São Paulo, a minha lembrança e relação com clube se misturam muito com o bairro que eu cresci: Itaquera.

A primeira lembrança que me remete ao clube é por volta do finzinho dos anos 90, não tenho certeza de quando, diria que é quando eu tinha entre 3 e 5 anos de idade, ali entre 98 e 00.

Eu estava deitado no sofá com meu pai, igual sempre fazíamos, ele esparramado no sofá vendo televisão (ás vezes dormindo) e eu deitado na outra ponta em cima das pernas dele. Acho que era um Corinthians e Grêmio que teve algum gol do Marcelinho Carioca.

Foi ali que eu me percebi corinthiano: comemorando um gol com meu pai. Gol do jogador que pra mim é o maior ídolo do clube.

Em alguns momentos, minha irmã também estava na “festa”. Disclaimer: eu tenho uma irmã gêmea palmeirense. Sim. Somos opostos em tudo, até nisso. Claro que em dia de clássico era um zoando o outro (e ás vezes brigando). Meu pai falava que quando nascemos e o médico deu aquela palmada na bunda dos bebês para eles chorarem, eu falei “Timão” e a minha irmã arrotou porque era porca. kkkkk

Enfim.

Acervo Pessoal

Além de comemorarmos dentro de casa, escutávamos o bairro inteiro gritando das janelas. Itaquera, região da COHAB 2, um conjunto de prédios populares na periferia da zona leste. Sim, o mesmo bairro que hoje é sede da Arena do clube.

Eu cresci respirando Corinthians. Na escola, na rua, na minha família, dentro de casa. Era corinthiano em tudo quanto é canto. Apesar de não ser uma criança tão fanática por futebol, eu me tornei um adolescente que jogava e acompanhava muito o assunto. Me lembro das zoações na escola por conta do rebaixamento. Me lembro do acesso, e como foi emocionante consolidar aquela retomada para um lugar que nunca deveria ter saído.

Mas o que mais marca a minha memória é a energia que o bairro sempre expeliu em dia de jogo. Era todo mundo usando a camisa. Era conversa nos bares, na fila do mercado, nos comércios. Sempre foi comum ver aqueles gritos de “Vai Corinthians” quando duas pessoas com a camisa do clube passavam pela calçada.

Itaquera adotou o Corinthians como clube antes mesmo do Corinthians adotar Itaquera como casa. Embora o clube tenha nascido no centro de São Paulo, a sua história e sua energia pulsa na margem da cidade. Principalmente na Zona Leste.

Pensar na minha vida, e como ela transita pelo contraste centro-periferia, me faz pensar também na importância do Corinthians para construir uma identidade local. Uma identidade de quem é da ZL. Identidade de quem pega a linha vermelha lotada, ali na estação Corinthians-Itaquera, toma uma cerveja na Silvio Romero, ali no Tatuapé, e sabe que quando o Corinthians levanta uma taça, o fluxo na quebrada vai tá o fervo.

Imagem retirada de uma matéria do Estadão — Werther Santana / Estadão

A sede do clube fica no Tatuapé. O CT fica na divisa da ZL com Guarulhos. O estádio fica em Itaquera. Nada disso é por acaso. O clube do povo tem na região mais populosa da maior cidade da América Latina boa parte da construção de sua história.

Em 2012, quando aquele Corinthians x Chelsea terminou, eu peguei minha bandeira e subi com uns amigos aqui da rua onde eu moro para a avenida principal do bairro. Claro que nós não éramos os únicos a fazer isto. Tinha tanta gente na rua que carros e ônibus não passavam. Inclusive, tinha gente subindo no ônibus para comemorar. Era buzinaço, gritaria e um canto único de “Aqui tem um Bando de Loucos…”.

Em junho daquele mesmo ano, depois do show do Emerson Sheik no Pacaembu contra o Boca Jrs, uns amigos foram até o terreno do que seria a Arena para comemorarem a libertação que vivíamos naquele momento.

Isso é Corinthians. Isso é Corinthians na quebrada.

Entender tudo isso me fez ainda mais Corinthiano. Entender como uma Arena em um bairro de periferia abriu uma Copa do Mundo me fez ainda mais Corinthiano. O Corinthians ajudou a construir algo na periferia da zona leste que vai muito além de sediar uma copa: ajudou a construir autoestima. Ajudou a reconhecer identidade.

Quem morava em Itaquera antes do estádio, escutava com uma frequência maior que morava na “Zona Lost”. Hoje, as pessoas perguntam primeiro se você mora perto do estádio antes de fazerem algum tipo de piadinha do tipo. Isso vale muito.

Parabéns pelo seus 110 anos de história, Corinthians. Mas acima de tudo, obrigado por estar presente onde o povo realmente está: nas margens da cidade.

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Gabriel Lopes de Paula

UX Researcher | Estrategista de Marca - Escrevo sobre reflexões e trabalhos da vida, do Design, da comunicação, da quebrada e de vários outros assuntos.